Eu, lésbica?!
Meu processo de autodescoberta e um papo sobre uma visão diferente do que é a lesbianidade.
Minha jornada com a lesbianidade.
Eu sei que amo garotas desde os dez anos. Quando percebi isso, me disse bissexual. Porque era óbvio que eu também gostava de garotos. Não porque eu vivia apaixonade por eles, mas porque eu achava que garotas sempre amavam garotos. Nem parecia existir um mundo onde as coisas não eram assim. Todas as mulheres e garotas ao meu redor, mesmo as que amavam outras garotas, se atraiam por homens.
Com doze anos, finalmente aceitei que eu não era uma garota. Primeiro me rotulei como gênero fluido e, depois, como um cara trans. E foi aí que minha vida perdeu o brilho. Além de tentar me encaixar a todo custo nos conceitos machistas e sexistas de masculinidade, eu me forcei cada vez mais a ser "um cara que ama caras". Só que, evidentemente, eu não era nada disso. Sofri por muitos meses com a pressão de ser o mais masculino e, ao mesmo tempo, o mais gay possível. Eu queria ser um garoto passavel, mas, acima disso, ser um garoto gay passavel. Nesse tempo, me obriguei a gostar de garotos, não usar as roupas "femininas" que eu gostava, não ser tão alegre e delicade, falar de um jeito que não me agradava, mas era masculino.
Cerca de um ano depois do começo desse sofrimento, eu tive uma conversa com meus pais. Foi a primeira depois de meses que me ajudou em algo. Foi durante ela que percebi que não era um garoto. A partir daí comecei a me entender agênero e bissexual, sem contar a assexualidade que eu havia descoberto no meio do ano. Então, voltei a me sentir conectade com minha feminilidade e, com isso, comecei a celebrar meu amor por garotas. Ainda era algo tímido, mas foi o começo de tudo.
Pouco depois disso, entrei em um relacionamento com uma pessoa que era minha grande amiga. Foi durante esse relacionamento que eu entendi muitas coisas. Eu era demi-aroace e isso se conectou com muitas coisas. Eu não precisava mais esconder meu desconforto com certos assuntos, nem me forçar a gostar das pessoas. Ou quase isso. Eu continuei muito convencide de que gostava de garotos, mesmo não vendo nada de interessante neles. Vários meses depois, eu lancei a pergunta para uma amiga da época: "Amiga, será que eu sou lésbica?". Quando fiz essa pergunta, não parecia haver muitos motivos para ela, apesar de hoje eu ver que, sim, existiam muitos. Passamos a madrugada toda falando sobre este confuso assunto. Para nós, tudo se encaixava, menos uma coisa: minha namorada. Ela, que era uma pessoa não binária designada homem ao nascer, provavelmente era a garota mais feminina que eu conhecia, mas também alguém que causava dúvida na minha amiga, que por sua vez enfiou na minha cabeça que isso era problema. Mas então eu acordei, minha namorada não era um garoto e eu não precisava gostar exclusivamente de garotas para ser lésbica. Afinal, eu mesme não era uma garota. Foi aí que tudo fez sentido. Eu era, sou e sempre seria lésbica independente do que as pessoas pensassem da minha lesbianidade.
Cerca de três meses depois de descobrir lésbica, eu assisti ao filme 'But I'm A Cheerlearder', Ou 'Nunca Fui Santa' em português. Pela primeira vez eu me vi de verdade em um filme. Megan, a protagonista, era uma versão loira e estadunidense minha. Assim como ela, eu sempre fui considerada uma pessoa perfeita e santa. E, acima disso, boa demais pra dar o desgosto de ser lésbica a sua família e amigos. Mas eu e Megan não éramos nem santas nem perfeitas, éramos lésbicas e queríamos ser livres. Eu, que sabia que já tinha desapontado e incomodado muito minha família com minhas questões de gênero e sexualidade e já não me importava mais com isso, senti um profundo medo. O que será que ser lésbica poderia representar pra minha vida?
Ser lésbica, na minha cabeça, significava nunca mais ser amada por completo pela minha família. Às vezes, eu pensava melhor e concluía que era bobagem, mas depois vinha alguma fala que me derrubava.
"Tem males que vem para o bem."
- Minha avó materna após descobrir que a filha de uma vizinha não engravidaria por ser lésbica.
Essa fala alfinetou meu coração. Mesmo que minha avó tenha achado bom que a garota era lésbica, ela só pensou assim porque, teoricamente, a menina não engravidaria. Mas, mesmo assim, ser lésbica era ruim. Era um mal.
Depois que me entendi lésbica, pouco tempo se passou e voltei a usar o rótulo bissexual. O que eu achava ser o mais correto já que "eu tinha me preceptado quando me disse lésbica", nas minhas próprias palavras, hoje vejo que era só medo e dificuldade de admitir que sim, eu não gostava de garotos.
As coisas dentro de mim só foram mudar depois de perceber que gostar de garotos não me era algo natural. Então, num belo dia, um amigo me perguntou qual a minha sexualidade. Eu sem pensar, respondi: "lésbica". Foi algo bobo, mas que me libertou de uma maneira gigantesca.
Toda a minha jornada é algo relativamente recente, considerando que eu tenho apenas quatorze anos, mas completamente válida como a jornada de todas as pessoas lésbicas estão lendo esse texto.
Lesbianidade e não binariedade: onde essas duas coisas se encontram?
É provável que tu não tenha entendido muito bem a relação entre ser lésbica e ser não binário. A conexão entre essas duas coisas até que é bastante falada atualmente, mas falta bastante explicação pra que o público em geral possa entender. Então vamos a explicação: Uma pessoa lésbica é mais do que uma mulher que sente atração romântica e/ou sexual por outras mulheres. A explicação mais simples que tenho pra dar pra ti é a seguinte, lésbica é aquela pessoa que se identifica com o gênero feminino ou um gênero neutro e sente atração romântica e/ou sexual por pessoas que se identificam da mesma forma que ela. Sabendo disso, é fácil entender que lésbicas podem, sim, ser não binário e elas são, sim, tão válidas quando lésbicas que se identificam como mulheres.
Acho que falar sobre essas formas não tão conhecidas de apresentar a lesbianidade, pode abrir discussões muito importantes para a comunidade.
Uma delas é a seguinte: nem toda lésbica tem o mesmo corpo. E eu não estou falando de peso. Sendo mulheres ou pessoas não binárias, pessoas lésbica não são obrigadas a ter, necessariamente, vagina e seios. Afinal, mulheres trans, pessoas não binárias do sexo masculino, mulheres intersexo e mulheres que passaram por uma mastectomia, podem ser, com toda certeza, lésbicas.
Muita gente ainda não consegue compreender essa visão mais abrangente da lesbianidade. Por isso, ocorre muita invalidação da nossa sexualidade e identidade de gênero. Mas, querida pessoa lésbica, não aceite essas opiniões como a verdade. Sua forma de amar, seu gênero, sua expressão e seu corpo são válidos e você é sim lésbica.
Espero que tenham gostado do que leram. Peço desculpas pelos pontos confusos e possíveis erros de português. Qualquer dúvida,história pra compartilhar ou crítica construtiva, é só deixar um comentário.
Beijinhos com sabor de morango do Nalu!